• Acessibilidade: os dilemas vividos por pessoas diagnosticadas com autismo

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13 de setembro de 2021 por 

Por:
Anderson dos Santos Macedo
Bruno Hallisson Justino de Aquino
Emilly Melo Souza
Geraldo Alefy Oliveira da Silva
Patrick Pinheiro Alves

Associação de Pais Amigos e Profissionais dos Autistas do Cariri – Foto: Arquivo pessoal/Ana Moésia

Incluir pessoas com algum tipo de necessidade especial na participação de atividades como o uso de produtos, serviços e informações, é colocar em prática a chamada acessibilidade. Prédios com rampas de acesso para cadeira de rodas e banheiros adaptados para quem possui mobilidade reduzida, são alguns exemplos, na prática, de como essa palavrinha – que não é nada pequena -, pode se tornar ainda mais gigante e fazer a diferença na vida de muitas pessoas. 

A Lei nº 10.098 do ano 2000, garante a promoção de acessibilidade voltada para este público, mas apesar disso, o cenário na maioria das cidades brasileiras ainda é bem diferente do que está previsto. No Cariri cearense, por exemplo, ações como essas ainda são um desafio para alguns municípios. Juazeiro do Norte, a “capital da fé”, localizada no interior do Ceará, é um deles.

Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010, apenas 0,41% do município conta com rampas para cadeirantes, representando um índice menor que os 3,16% da média nacional. Segundo a pesquisa, os problemas conseguem ir ainda mais longe. Do total das ruas da cidade, 6,7% não são pavimentadas, e 9,7% das vias estão sem calçadas.

Se pararmos para pensar no número de pessoas com necessidades especiais, a situação é ainda mais preocupante, o município de juazeiro conta com 20.265 pessoas incluídas neste perfil, o equivalente a 8,10% da sua população local.

Mas uma necessidade especial pela qual daremos maior atenção, ainda na região do Cariri, a partir de agora, é uma realidade marcada na vida de algumas pessoas, estamos falando do Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou como ele é mais conhecido, o autismo.

Este transtorno, de maneira geral, afeta a região do sistema nervoso, além da parte motora, fazendo com que muitos dos autistas precisem de um auxílio fisioterapêutico. É o que afirma a estudante do quarto semestre de fisioterapia do Centro Universitário Doutor Leão Sampaio, Aline Vitorino Martins, de 33 anos.

Essas crianças com síndromes geralmente tem essa limitação, então a fisioterapia atua diretamente para restabelecer a motricidade dessas crianças”.

O diagnóstico do autismo pode ser confirmado logo no início da infância por um pediatra ou por um psiquiatra, como foi o caso de João Murilo, 07 anos, da cidade de Crato. Elis Regina, mãe do garoto, descreve como foi o processo para a confirmação do TEA, em nível 2, do seu filho.

Ele foi diagnosticado com TEA, que é o Transtorno do Espectro Autista, aos três anos de idade. Eu tinha levado ele na fono, por conta do atraso da fala, e ela me encaminhou para a neuropediatra e ela, na primeira consulta, já deu o diagnóstico dele”, afirmou Elis.

Entendendo o Autismo

O autismo é uma síndrome que afeta a comunicação e a capacidade de interação, fazendo com que a pessoa diagnosticada apresente certa dificuldade de comunicação, socialização, ou de comportamento.

Existem três níveis de autismo.

O nível 1 é considerado o mais leve. Os portadores que correspondem a este grupo podem ter dificuldades em situações sociais e comportamentos restritivos e repetitivos. Eles requerem apenas um suporte mínimo para ajudá-los nas suas atividades em seu cotidiano.

O nível 2, considerado um nível moderado, corresponde aos autistas que têm maiores dificuldades com habilidades sociais e em situações sociais, em comparação com as que estão no primeiro nível. Podem ou não se comunicar verbalmente e se o fizerem, suas conversas podem ser curtas ou apenas sobre tópicos específicos. Dessa forma, podem precisar de suporte para participar de atividades sociais.

O nível 3 é o mais severo, as pessoas com este diagnóstico precisam de muito apoio, já que esta é a forma mais grave da doença. Ela basicamente afeta a região do sistema nervoso, além da parte motora, fazendo com que muitos dos autistas precisem de um auxílio fisioterapêutico.

Políticas Públicas

Para Regina, mãe do pequeno João Murilo, o município do Crato oferece um acompanhamento para essas crianças, porém, existe uma escassez de especialistas, que acaba ocasionando uma rotatividade muito significativa entre os profissionais, fazendo com que as crianças não consigam encontrar estabilidade no tratamento.

Em 2012 foi criada a Lei nº 12.764. No seu artigo 1º, no segundo inciso, ela diz: “a pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência para todos os efeitos legais”.

Foi através dessa determinação que direitos importantes como a aposentadoria, dessas pessoas, foram garantidos. No caso das crianças, há de se levar em consideração, ainda, o impacto na limitação do desempenho de  suas atividades e na participação social compatível com a sua idade.

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), é uma ajuda de custo no valor de um salário mínimo, disponibilizada pelo governo às famílias que têm pessoas com necessidades especiais, e que não se limita apenas ao autismo. Ele pode ser solicitado em qualquer Agência da Previdência Social. Para isso é preciso que a pessoa com necessidade especial seja inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico).

Sobre o atendimento municipal para essas crianças, Aline afirma que não vê projetos exclusivos destinados a elas no município do Crato. Ao acompanhar de perto algumas mães, ela consegue enxergar a falha do município cearense com relação à falta de profissionais para a realização do tratamento dos pequenos.

Depoimento de Aline sobre o atendimento municipal

Além de desafios como estes, é preciso mencionar outros problemas enfrentados por crianças como João. O preconceito e a inclusão social dessas pessoas no ambiente escolar, é um deles.

Educação

Como primeira instância de convívio social de uma criança, o ambiente escolar precisa ser a base para uma educação de qualidade e inclusiva, permitindo assim, o desenvolvimento de um senso crítico.

Segundo a palestrante e presidente da Associação de Pais Amigos e Profissionais dos Autistas do Cariri, Ana Moésia, 42 anos, em muitos casos, os próprios espaços de formação social e intelectual dificultam o desenvolvimento dessas crianças diagnosticadas com TEA. A má adaptação, somada à falta de materiais escolares e pedagógicos, são um dos principais fatores para esta dificuldade.

Mesmo estando prevista na Lei N° 12.764, de 2012, que garante a inserção e suporte aos portadores de autismo à educação e ao ensino profissionalizante, algumas instituições não possuem ferramentas adequadas para cumprir essa determinação. Fatores como preconceito e discriminação dificultam ainda mais essa realidade. Criando assim um cenário de incertezas para essas crianças e suas famílias. Para Ana, essa é uma das principais preocupações das famílias.

Depoimento de Ana

Apesar da segurança na Constituição, muitas famílias, além de precisarem lidar com o medo do convívio e a falta de amparo necessária para seus familiares, precisam enfrentar problemas como a não garantia de uma simples matrícula em uma escola, seja ela da rede pública ou particular.

Em algumas dessas instituições, a falta de condições ou verbas suficientes para o atendimento correto destas pessoas, acaba sendo umas das razões para que isto aconteça. A falta de material adaptado e atividades pedagógicas lúdicas que facilitem o entendimento e a educação, são outros exemplos reais dessa barreira.

Empatia

A compreensão de que é preciso, cada vez mais, se colocar no lugar do outro, pode ser o primeiro passo na busca por uma solução destes e muitos outros desafios. Ana Moésia deixa um recado sobre perseverança e aceitação. Em um relato pessoal, ela conta como é importante o apoio familiar para estas crianças.

Meu conselho para todas as famílias que têm filhos com autismo ou com qualquer tipo de deficiência ou diversidade, que enfrentam discriminação, preconceito, é que eles conheçam e reconheçam os seus filhos como eles são. Que a gente consiga sempre estar nessa luta, lutando pelos direitos para que eles consigam ser incluídos na sociedade, aceitos como eles são e recebendo tudo que eles precisam para se desenvolver e serem pessoas autônomas”.

Colocar em prática a acessibilidade não é só uma questão de qualidade de vida, mas de respeito e amor à diversidade social.

Inclusão acolhe, respeita e sobretudo, não diferencia.

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