“Cerca de 40 pessoas deixaram uma sala de cinema em Niterói (RJ) em repúdio às cenas de sexo entre os personagens de Wagner Moura e Clemens Schick no filme Praia do Futuro. Em João Pessoa (PB), segundo relatos postados nas redes sociais, para evitar debandada semelhante, o espectador é avisado já na bilheteria: “o filme tem cenas de sexo gay, você tem certeza de que quer assistir?”. Um carimbo de “avisado” serviria como atestado de que o cliente entrou na sessão em sã consciência. Seria uma vacina contra eventuais ofensas ao pudor: “não peça o dinheiro de volta, nós avisamos”.” Esse foi o parágrafo que figurava na Revista Carta Capital no dia 21/05/2014. Palavras inquietantes que deixam a mostra um preconceito que vem perpassando nossa vivência.
Podemos nos perguntar se em um país que tem uma das melhores constituições já escritas e com a existência dos direitos humanos, por que ainda acontecem tantos crimes homofóbicos? Os direitos humanos servem como lema de várias instituições contra a intolerância, sendo formulados depois de terem acontecido muitas perseguições contra “as minorias”. Esses direitos ecoam por uma liberdade, e por igualar todas as pessoas, porém na prática eles acabam encontrando alguns empecilhos, já que é proposta uma intervenção do Estado, que tem limitações entre as normas e suas aplicações, e que encontram resistências locais, vinculadas muitas vezes a cultura e religião. Mesmo sendo uma conquista, os direitos humanos ainda não nos asseguram um distanciamento de uma padronização do modelo de homem, branco, heterossexual.
Estes estereótipos aos quais somos submetidos, advém de uma formação cultural que vai sendo passada adiante, ao qual naturalizamos práticas de descriminações. Estamos submersos cada vez mais em nosso próprio universo minimizando o que nos parece alheio, assumindo uma reprodução superior a reflexão. Partindo da premissa de que somos construções sociais, a culpa por ações homofóbicas estaria recaindo sobre o sujeito ou sobre as práticas culturais as quais estamos inseridos? Transferindo à cultura, toda responsabilidade pelas ações machistas, homo/lesbo/transfóbicas, nos abstemos da nossa participação. É verdade que estamos submetidos a práticas que trazem em si o preconceito e reproduzindo as mesmas estamos dando a nossa contribuição para a sua proliferação. Aceitando o que nos é posto sem a proposição de mudanças, somos atores passivos. As instituições de representação pública, na medida em que não são rigorosas com determinadas ações avultantes reforçam o preconceito, que chega até as nossas ações. Somos atores e autores da história, podendo assim contestar o regime existente, resignificando a nossa lógica de interação e reflexão.
Afirmando que existem outros mecanismos e instituições atuantes no processo de reprodução de tais práticas, temos então a visão da mídia sobre os fatores de diversidade. Os meios de comunicação devem ter um compromisso com o interesse público, fato que na prática geralmente não acontece. A corrida mercadológica para a obtenção do lucro vem priorizar a audiência e os anunciantes, tornando precária uma postura educativa. O direito a representatividade existe, mas ele não é respeitado. A democratização da comunicação vem como uma possível solução para este processo, já que existe um oligopólio da comunicação e estas grandes redes acabam não sendo reguladas. As concessões não são renovadas, a Anatel não age como órgão regulador, e “as minorias” não tem voz, nem vez nos grandes meios.
Enquanto o direito a livre orientação sexual não for pautado realmente como direito, o meio social vai estar tomado por ações desiguais. Pegamos um pouco de pão, vemos um pouco de circo, e está tudo bem no país do futebol.